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Sobre o Maio de 68 – Uma viagem pelas margens da esquerda com Lola Miesseroff e Júlio Henriques

Sobre o Maio de 68 – Uma viagem pelas margens da esquerda


Na longa história das lutas sociais e políticas, o Maio de 68 francês, que ficou famoso sobretudo pelas imagens espectaculares de jovens estudantes a arremessar paralelos à polícia no Quartier Latin ou os slogans repletos de heresias espalhados pelas paredes de Paris, ocupa um lugar especial.
Não tendo levado, de modo relevante, a mudanças formais do regime político então vigente, o Maio de 68 teve, no entanto, profundas repercussões em diferentes níveis, sendo encarado por muitos como um dos mais importantes marcos políticos e culturais do século XX e da sociedade capitalista do pós-guerra, cujas ressonâncias se fizeram sentir um pouco por todo o mundo.  
Lola Miesseroff vem de França para nos falar desses dias, dando-nos um testemunho e uma perspectiva baseados nas suas próprias experiência e sensibilidade, numa reflexão que desafia as narrativas oficiais com os seus heróis consagrados, para nos levar numa viagem por lutas e sujeitos da época que a História fez por esquecer.
Júlio Henriques juntar-se-á a esta conversa, que terá como ponto de partida o livro Voyage en outre-gauche: Paroles de francs-tireurs des années 68 (Lola Miesseroff, Editions Libertalia, 2018), trazendo-nos um olhar atento e crítico sobre o processo francês e o modo como a revolta de maio foi acolhida e se repercutiu por cá.
É no dia 10 de junho, pelas 18h, e será servido jantar quando a conversa terminar, por volta das 20h. A apresentação será em inglês e português, a ver se toda a gente se percebe.

Lola Miesseroff é filha de refugiados russos, ambos anarco-naturistas-individualistas, e nasceu em Marselha, onde teve a sorte de ter crescido num ambiente livre e politicamente engajado. Com 20 anos de idade durante o Maio de 68, Lola decidira recentemente deixar a universidade. É por essa altura que se dedica de corpo e alma ao movimento revolucionário efervescente, nunca deixando, desde então, de procurar a destruição do velho mundo.

Altamente influenciada pelos situacionistas e pela esquerda comunista, Lola Miesseroff rejeitou qualquer forma de organização permanente ou de militância sacrificial, assim como o casamento e a procriação, escolhendo, ao invés, participar livremente em inúmeros projectos subversivos de natureza colectiva, desde o Maio de 68 aos Coletes Amarelos.
Lola Miesseroff publicou o seu primeiro livro aos 70 anos – Voyage en Outre-Gauche: Paroles de Francs-Tireurs des Années 68 («Uma Viagem Para Lá da Esquerda: Palavras de Resistentes dos Anos 1968») –, um relato das lutas desses anos tal como foram experienciadas pela corrente política que denomina de «para lá da esquerda». O seu segundo livro – Fille à Pédés –  foca-se na sua vida e na sua luta ao lado do movimento gay, com especial ênfase na sua passagem pela Front Homosexuel d’Action Revolutionnaire-FHAR (Frente Homossexual de Acção Revolucionária). Fille à Pédés será publicado nos EUA em 2023. Além disso, Davaï, um livro que recorda a ascendência maternal da autora, composta por mulheres rebeldes, russas, judias e apátridas, tem publicação prevista para Setembro deste ano.

Júlio Henriques é tradutor e editor. Fez jornalismo independente nos semanários Comércio do Funchal e Litoral, este de Aveiro, onde fez parte do Círculo Experimental de Teatro. Refractário à Guerra Colonial, participou, em França, no movimento de oposição ao regime fascista português e em colectivos franceses. No período do 25 de Abril, foi membro do colectivo Combate, editor do jornal do mesmo nome, que defendeu a auto-organização e autonomia das classes trabalhadores.
Fez parte das editoras Fora do Texto (Coimbra) e Fenda (Coimbra e Lisboa), e está ligado à Antígona desde os seus começos. Publicou as revistas Subversão Internacional e Pravda – Revista de Malasartes, editando presentemente a revista Flauta de Luz e os Livros Flauta de Luz. Colaborou nas revistas Utopia e Coice de Mula, colabora no jornal Mapa e na revista A Ideia. É autor de alguns livros de poesia e de ficção. Vive no mundo rural desde os anos 80, tendo feito parte da associação de horticultores e agricultores Colher para Semear.

Sobre o livro Uma Viagem Para Lá da Esquerda: Palavras de Resistentes dos Anos 1968por Lola MiesseroffEdições Libertalia, 2018:

«Este livro não é um Quem É Quem, nem um romans à clefs nem um thriller, mas antes uma viagem exploratória que nos leva para lá da esquerda, das suas aventuras e perspectivas, antes, durante e depois de 1968.»

O ano de 1968, em França, traz normalmente à memória aqueles clichés fáceis e chamativos, como as barricadas no Quartier Latin, os carros a arder, a escassez de gasolina, os soixante-huitards que viraram hippies ou acabaram por fazer carreira. Em primeiro lugar, as pessoas esquecem-se de que o Maio de 68 foi apenas o culminar de uma longa revolta de jovens e trabalhadores que começou muito antes e perdurou durante bastante tempo; segundo, que também havia protestos muito acesos bem longe de Paris; e, terceiro, que tanto os estudantes quanto os grupos maoistas e trotskistas eram apenas a componente mais visível do movimento.

A autora faz um retrato bastante diferente: o de uma massa heterogénea e móvel, a que chama “constelação para lá da esquerda”, indo dos anarquistas independentes à ultra-esquerda e aos situacionistas. Lola Miesseroff recorre a várias vozes para com elas tecer experiências e teorias, histórias e ideias, esperança e desespero, não esquecendo o sexo, as drogas, o free jazz e o rock’n’roll, tudo isto com uma pitada de humor violento.